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segunda-feira, 1 de julho de 2013

MONÓLOGO DE SGANARELLO - Por Moliere


MONÓLOGO DE SGANARELLO 
Por Moliere
(De o Médico à força) 
SGANARELLO, SÓ 
Quer vingar-me o cherubim! 
Deus lhe dê felicidade!
Com que generosidade 
As dores toma por mim! 
A indignação que lhe excita
A minha enorme desgraça
O quanto é mister que eu faça
Claramente me suscita. 
De semelhantes ataques, 
De tão pesadas afrontas
Não pedem severas contas 
Só medrosos e basbaques. 
Com toda a resolução 
Eu vou... vou já!... neste instante
Mostrar àquele tunante 
Que não sou nenhum poltrão! 
Ele não há de voltar, 
Nem um minuto sequer,  
A cobiçar a mulher
 Do próximo !
( Dá alguns passos e volta. De vagar.)
Tem-me cara o rapazote
De muito desabusado...
Seu Sganarello, cuidado;
Vai com muita sede ao pote!
Teria graça que eu fosse
Expor-me à pancadaria 
De criar bicho! - seria
Em cima de queda, coice!
Não considero sensato
O homem metido a valente, 
E aprecio enormemente
O cidadão que é pacato. 
Com medo de ser batido, 
Fujo sempre de bater; 
Foi virtude, é, e há de ser
Ter um gênio comedido. 
Mas a minha honra exige
Num pronto me desagrave
 De um desaforo tão grave, 
Que tanto e tanto me aflige! 
Ora! faça-me o favor!
Exija quanto entender, 
Que lhe hei de sempre fazer
 Ouvidos de mercador. 
Se eu provocar uma briga, 
E um ferro bem afiado
Transpassar de lado a lado
A minha pobre barriga; 
Se eu morto cair, em suma, 
De sangue todo coberto, 
A minha honra por certo 
Não lucrará coisa alguma! 
Em pavoroso ataúde 
Ninguém por gosto se esconde, 
Pois é lugarzinho aonde
Não vai quem preza a saúde.
Antes marido enganado
Pela mulher, que defunto! 
Que mal isso faz? pergunto; 
Fica-se torto ou aleijado? 
Oh! maldita a vez primeira 
Em que por extravagância
Ligaram tanta importância 
A semente frioleira! 
A hora do homem mais liso
(Como me preso a ser) 
Depende do proceder
De uma mulher sem juízo! 
Se todo o crime é pessoal, 
Como o direito apregoa,
O crime de outra pessoa
Não me pode deixar mal. 
Tenho das ações alheias
A responsabilidade; 
Se a minha cara metade 
Faz por aí coisas feias, - 
Contra o meu nome, que é meu, 
O mundo inteiro arremete, 
E o asno devo ser eu!
Que abuso! que crueldade! 
Deviam já decretar
leis que fizessem cessar 
Tão medonha iniquidade! 
Aos pobres homens não bastam 
Tantos outros acidentes
Incômodos e frequentes
Com que os míseros se agastam? 
As moléstias, as demandas, 
E o mais que apoquenta um homem, 
A paciência lhe consomem, 
Fazem-no  andar em bolandas, 
Sem precisar que se rale, 
Se amofine, se consuma, 
E morra por amor de uma 
Coisa que de nada vale! 
Adeus! coração a larga, 
Que um homem tudo suporta! 
A mim bem pouco me importa 
Que o mundo me faça carga!
Quem errou? Minha Mulher: 
Ela que chore e se aflija; 
Eu, que tonho uma alma rija, 
Não me incomodo sequer!
Demais, o caso é comum, 
E a lembrança me alivia 
De que desta confraria
Eu não sou numero um. 
Há muita gente bem posta, 
E de gravata lavado, 
Que se cala não fala nada
Em vendo mouros na costa...
Bravatas e valentias
Arrotar não é prudente 
Por amor de um incidente 
Que se dá todos os dias. 
Se me não desagravar. 
Tolo, sei, me chamarão: 
Não tolo, mas toleirão
Serei, se a pele arriscar!
(levando a mão no peito.)
Mas sinto... sinto que a bílis
No meu peito se derrama, 
E uma voz cá dentro clama: 
"ânimo! Vai! não vaciles!" 
Pois não quero vacilar! 
Sim, não quero ser poltrão!
Hei daquele ladrão 
Vingar-me! E, p'ra começar, 
Vou - é caso decidido! - 
Vou pô-lo de cara à banda, 
Dizendo a todos que ele anda
Com minha mulher metido!
.

Esse monólogo, (Comédia de Moliere) foi traduzido por Arthur Azevedo. 
Nele, Moliere fala de Sganarello, se diz traído, se auto aconselha e ao mesmo tempo aconselha aos outros homens que são traídos por suas mulheres. Fala da mulher sem juízo que trai o marido e que não vale a pena brigar por ela. 
Nicéas Romeo Zanchett 
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